(Liturgia
do Décimo Quinto Domingo do Tempo Comum)
“Esta
palavra está ao teu alcance, está em tua boca e em teu coração, para que a
possas cumprir”.
Sabemos que no mundo há milhões de
pessoas que ainda não tem acesso à liberdade de ter a bíblia nas mãos, sobretudo
em nações em que o regime totalitário impera, impossibilitando a liberdade
religiosa e a proximidade com a Palavra de Deus.
Mas não só. Quantas vezes
constatamos também que a Palavra de Deus, na realidade, está muito longe dos
cristãos. Alguns, pelo fato de não terem permissão ou acesso, como dissemos,
outros porque se afastaram dela e permitiram ser guiados por outras vozes,
muito diferentes dela.
Isso acontece não porque Deus
está a milhares de anos luz distante de nós. Pelo contrário, quem tem fé sabe
que Deus caminha lado a lado conosco todos os dias e que podemos encontrá-Lo
facilmente na história que vivemos no cotidiano, sobretudo nas lutas da nossa
vida, como também nas pessoas que encontramos pelos caminhos da vida e da
história.
A Palavra de Deus deste décimo
quinto domingo do Tempo Comum “pinta” no seu quadro o tema da “proximidade”.
Creio que podemos colher duas lições desse apelo à proximidade, sobretudo com
aquelas pessoas que precisam que sejamos o seu próximo.
Primeiramente, trata-se da
proximidade de Deus através da Sua Palavra. Diante de tantos povos que não tem
acesso à Palavra de Deus ressoa sempre o sinal da fome e da sede que tem da
Palavra de Deus, do desejo de estar próximo d’Ele, através da Sua Palavra. Homens
e mulheres de todos os tempos têm feito essa experiência.
O nosso tempo vê como nunca a era
do acesso à comunicação e à informação. Isso é bom, mas não significa maior
proximidade com a Palavra de Deus, não obstante a abundância de palavras e
vozes dirigidas a nós, através dos mais diversos meios.
Na verdade, já não se sabe mais
quais dessas palavras e vozes seguir, em qual delas confiar. Por causa do
excesso de vozes e palavras, na grande maioria vazias e que não preenchem os
vazios da vida porque não lhe dão sentido, chegam a relativizar a Palavra de
Deus.
Mas nesse nosso mundo cheio de
tantas palavras, uma mais artificial do que outra há, contudo, uma Palavra na
qual se pode confiar. Trata-se da Palavra de Deus, “provada no fogo” dos
séculos e na vida de tantas pessoas que passaram a enxergar de acordo com essa
Palavra, preenchendo a sua vida de sentido, de calor, de serenidade e de
felicidade; não sem provações!
Sim, a Palavra de Deus é certa e é,
verdadeiramente, acessível a nós, como nos diz de modo muito simples a primeira
leitura (Dt 30,10-14), “está em tua boca e em teu coração, para que
a possas cumprir”. Que possamos, de fato, pronunciá-la com a nossa boca e
com nosso coração para transformá-la em gestos concretos!
Como é bom poder escutar o
sussurro de Deus em nosso coração! É essa proximidade e acessibilidade que nos
lança e faz com que sejamos próximos também de quem encontramos pelo caminho! É
a proximidade da Palavra de Deus em nós que nos faz próximos dos outros.
Usamos o verbo “fazer” (próximos)
porque para um cristão não basta ter acesso à Palavra de Deus e tê-la próxima
de si. Como não basta, tampouco, estar consciente daquilo que Deus suscita em
nossos corações, e não basta alegrar-se porque pode fazer experiência concreta
de como Deus nos fala!
Se a Palavra de Deus “permanece”
apenas como uma experiência individual, está fadada a morrer, a desaparecer. O
motivo é simples: a Palavra de Deus cria no nosso interior alegria e serenidade
que, conseqüentemente, se exterioriza e é expressa no nosso exterior.
Não seria possível retê-la ou
mantê-la egoisticamente de modo intimista e até mesmo fundamentalista. Por
causa dessa realidade os profetas foram homens que não podiam reter na sua
privacidade o que Deus suscitava no íntimo dos seus corações! (Cf. Jr 20; 1Cor 9,16; 1Jo 1).
Neste mundo tão confuso por causa
de tantas palavras e de tantas vozes, a necessidade que o cristianismo tem é
exatamente esta: pessoas proféticas, que fizeram e fazem a experiência
autêntica da Palavra de Deus!
Quando nos referimos à
necessidade de “serem pessoas proféticas” não se trata de ter e fazer
revelações sobrenaturais. Muito menos revelações do futuro! Em Jesus Cristo, o
Pai já se revelou e revelou o que tinha pra ser revelado!
Não é, com certeza, esse tipo de
profecia que anuncia o fim do mundo, como vimos há pouco e vamos ainda ver
muitas vezes, que precisamos! O que precisamos é de coragem para fazer, para
colocar em prática a simplicidade do Evangelho. Vivê-la nas escolhas da vida,
todos os dias.
Prestemos atenção no Evangelho de
hoje! Não é um fato tão extraordinário que uma pessoa que percorria a estrada
de Jerusalém a Jericó caísse nas mãos de assaltantes. Tanto é verdade que,
tanto o sacerdote como o levita não se detém para ajudar o homem ferido caído à
beira do caminho. Talvez porque, sendo uma situação corriqueira, não podiam se
envolver, nem se “contaminar”.
Mas o samaritano não tem medo
disso e pára, se envolve, sensibiliza-se, ajuda, o que, na verdade, deveria fazer
qualquer pessoa de bom senso.
Este tipo de atitude é um gesto
profético. É colocar a palavra de Deus em prática! Que pena que o sacerdote e o
levita perderam a oportunidade de colocar a Palavra de Deus, à qual tinham tanto
acesso e proximidade, em prática! Como eles nós também corremos esse risco. Eles
é que deveriam, em primeiro lugar, ter feito o que fez o samaritano, sendo
próximos do homem que estava caído no seu caminho! Principalmente, porque
conheciam a Palavra de Deus que ensina e exige essa atitude. Nós também
corremos o risco de institucionalizar e teorizar tanto a Palavra de Deus a
ponto de colocá-la em prática através de atitudes simples e diretas do dia a
dia.
Agradeçamos juntos ao Senhor que
está perto de nós com a Sua Palavra, que nos doa de modo tão simples a Sua Palavra,
e peçamos a Sua Graça para que possamos testemunhar a experiência do encontro com
Ele, sendo de modo muito simples, verdadeiro profetas, não tanto por aquilo que
dizemos, mas, sobretudo, por aquilo que fazemos!
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