Páginas


Pároco Frei Alfredo Francisco de Souza, SIA.


santaluzia@hotmail.com.br

Fone (14) 3239-3045


sábado, 26 de outubro de 2013

DIGA-ME COMO REZAS E EU TE DIREI QUEM ÉS!

(Liturgia do Trigésimo Domingo do Tempo Comum)

Toda vez que escuto o Evangelho deste Trigésimo Domingo do Tempo Comum (Lc 18,9-14), tenho a impressão, mais do que em outras parábolas, de estar eu mesmo ali, naquele tempo e naquele contexto, olhando para aqueles dois homens solitários em lugares diferentes daquele lugar sagrado.
Um deles é um fariseu, rigidamente de pé, de cumpridor da lei. O outro é um pobre coitado, inclinado, sob o peso dos seus pecados.  Sinceramente, confesso que às vezes também me sinto como o fariseu, mas com o desejo constante de ter aquela simplicidade do publicano.
Creio que esta Palavra de Jesus não quer  tanto apresentar uma parábola para ensinar “como” se deve rezar, mas pretende dar uma lição de vida.
É, de fato, o que se pode concluir, a partir do que o próprio Lucas diz claramente: “Jesus contou esta parábola para alguns que confiavam na sua própria justiça e desprezavam os outros”... Esta, de fato, é uma tentação generalizada, um tipo de “doença” presente nas pessoas de todos os tempos.
O Papa Francisco de vez em quando fala sobre este pecado que assume também as nuances de julgamento, de calúnia e presunção.
A presunção sempre nos prega peças e faz com que, todos os dias, tenhamos pelo menos uma oportunidade em que queremos vestir a toga de juízes para condenar os outros, desprezando-os. Aliás, presunção e desprezo são dois lados da mesma moeda.
O convite de Jesus, portanto, é duplo. Primeiro, é claro, Ele quer ensinar como rezar, mas não só. Ele quer, sobretudo, ensinar como viver, porque na parábola a oração é considerada como um “espelho” da própria vida.
Se, de fato, somos “fariseus” na oração, seremos também na vida. Se somos “publicanos” na oração, seremos “publicanos” na vida. Trata-se, na verdade, de uma parábola no estilo de Lucas, como os dois irmãos diante do Pai misericordioso, ou como na parábola do rico avarento e do pobre Lázaro.  
O fariseu da parábola nos faz pensar numa certa categoria religiosa observante, escrupulosa e escrava de um formalismo exterior, não aberta à novidade trazida pelo Evangelho de Jesus, quase sempre em polêmica com Jesus.
O publicano, ao contrário, nos recorda uma categoria social, a do cobrador de impostos, duplamente odiado pelo povo. Primeiro, porque é símbolo de uma política injusta e depois, porque é um judeu “vendido” para o poder de Roma.
Mas Jesus, na parábola, não quer condenar ou salvar uma categoria social, porque o bem e o mal não se definem pela pertença a uma ou outra classe social, política ou religiosa. Jesus se limita a lançar um foco de luz sobre as duas atitudes, tanto de oração como de vida, de dois homens que subiram ao templo para rezar.  
O que Jesus encontrou ali  é o que encontramos todos os dias, isto é, uma experiência que todos fazemos em nossas igrejas e comunidades. O fariseu é o homem de todos os tempos que encarna um tipo de oração que termina sempre em um monólogo, sem nunca se tornar o diálogo. Ele até começa bem, agradecendo, como o leproso curado de dois domingos atrás.
Mas infelizmente, logo a sua oração toma um rumo feio e morre. É isso o que acontece com quem têm o coração cheio de si. Há quem crê que, graças às suas práticas exteriores, Deus lhe deve mais.
O fariseu é a imagem de um homem ancorado no passado, aos hábitos estéreis, à prática do bem sem coração, incapaz de abrir-se à novidade do amor. Deus torna-se, nesse caso, apenas uma ocasião para que ele fale de si mesmo, no império do seu “eu”. Parece mesmo com muitos momentos de nossas vidas, em que somos os mestres de tudo e não tomamos consciência de que somos escravos de nós mesmos.
"O publicano, pelo contrário, não ousava nem levantar os olhos para o céu. Ele sentia o peso da infinita distância que a sua vida está com relação a Deus e sabe que isso só poderia ser superado através da misericórdia de Deus. Pede perdão com a esperança humilde de obtê-lo. Porque somente quando nos esvaziamos de nós mesmos podemos acolher a Deus.
Eis, portanto, a chave de toda a mensagem deste domingo, a humildade. Uma palavra não só impopular, mas quase banida da linguagem das pessoas do nosso tempo. Coisa de frades e freiras, pensa-se comumente. Pessoas que fizeram o estranho “salto” para um outro mundo.
Porque hoje é um imperativo viver a vida vivida debaixo dos holofotes e refletores do poder, e no centro das atenções.  Mas sem humildade não é possível encontrar Deus.
Somente uma oração verdadeira é capaz de mudar profundamente a vida, abrir o coração à resposta de Deus e torná-lo disponível para a paz consigo mesmo e com os outros.
Na verdade é isso que fará com que cruzemos os árduos obstáculos da nossa existência quotidiana. Isso só acontecerá quando aprendermos a lição que Jesus quer nos ensinar hoje, isto é, quando compreendermos que somente quando nos considerarmos perdedores poderemos vencer na grande prova do amor.
Portanto, aqui está a maravilhosa conclusão do Evangelho de hoje: o publicano voltou para casa "justificado". Jesus não disse que ele voltou apenas "perdoado", mas "justificado". É exatamente isso que acontece conosco quando recebemos a graça do Espírito Santo através dos sacramentos.
Deus não só nos dá o perdão dos pecados, mas, graças a paixão, morte e ressurreição de Cristo – que abriu para nós o caminho da vida – opera poderosamente em nós santificando-nos e renovando em nós o homem interior.
De acordo com o Catecismo da Igreja Católica (n° 1994) a “justificação” é definida como a obra mais excelente do amor de Deus.
Mas quem se relaciona com Deus e com a vida como o “fariseu” está fechado a esta obra da Graça. Para estes, como para o rico da parábola, mesmo tendo recebido a morte e a ressurreição de Cristo, a sua vida não muda!
Deus deseja para nós esta esplêndida ligação entre a sua Obra e a nossa liberdade. O publicano, com os olhos baixos, abriu o coração a este encontro e poderá olhar para Deus em todo o Seu amor. Talvez hoje isso possa acontecer também conosco. (Frei Alfredo Francisco de Souza, SIA - Missionário Inaciano - www.inacianos.org.br - formador@inacianos.org.br)


Nenhum comentário:

Postar um comentário