CRIANÇA DA FAVELA FERRADURA MIRIM QUE VEIO PEDIR A BÊNÇÃO APÓS A PREGAÇÃO DESTA HOMILIA (foto Sônia Neri - PasCom Santa Luzia) |
(Liturgia do Quarto Domingo do Advento C)
A
primeira leitura que escutamos neste Quarto Domingo do Advento, no livro do
Profeta Miquéias (5,1-4a), é um texto famoso da bíblia.
Lembra-nos
que o Messias virá de um jeito muito diferente de como tinha sido imaginado.
Virá com humildade e simplicidade, sem estardalhaço e sem glória.
Nascerá
numa pequena vila sem importância em Judá, chamada de “Bet Lehem”, que significa Casa do Pão.
É grande
o contraste entre: “E tu, Belém de Éfrata, pequenina entre os mil povoados de Judá”,
e o que vem depois das palavras: “Belém, pequenina, povoado”: “aquele que
dominará, tempos remotos, força do Senhor, majestade em nome do Senhor, dias da
eternidade”. Essa é
a lógica de um Deus que faz grandes coisas na pequenez, sem alarde, sem efeitos
especiais ou bombásticos.
Cada
um de nós é chamado a refletir, neste final do tempo do Advento, sobre o estilo
de um Deus, que busca o coração dos simples e pobres, para realizar projetos
grandiosos.
O primeiro
risco que corremos na preparação para o Natal é esperar Jesus de modo errado,
isto é, a partir da ótica da grandeza, da glória mundana, numa visão puramente
humana, que não tem nada a ver com a lógica de Deus.
Os
habitantes de Belém, na noite sublime do parto da Virgem Maria, não perceberam
o que estava, realmente, acontecendo na gruta, bem perto deles.
Foi
necessário que os “magos”, estrangeiros e gente “de fora” viessem de longínquas
terras para reconhecer no menino deitado na manjedoura “o dominador, o Príncipe da paz, o Messias”.
Outro
risco de que corremos de celebrar o Natal de forma equivocada é tê-Lo diante
dos olhos na própria família, na comunidade ou através das pessoas e situações
que chegam até nós, e não saber reconhecê-Lo!
Às vezes,
os mais distantes, os que estão “de fora” fisicamente da Igreja, podem “ver”
coisas que nós, que somos próximos e estamos dentro, não enxergamos.
O
Natal é, portanto, um convite a mudar a nossa maneira de olhar realidade à
nossa volta, purificando os olhos para saber acolher a Cristo com o coração
simples. Ele pode estar presente, inclusive, nas situações e contextos nos
quais a tendência é sermos levados a não reconhecê-Lo.
Os
caminhos de Deus são muito diferentes dos caminhos do homem! É a primeira
leitura ainda expressa isso com estas palavras: “Deus
deixará seu povo ao abandono, até ao tempo em que uma mãe der à luz”.
Esta é uma visão de um tempo novo maravilhoso! Enquanto
observamos, nestes dias, como as pessoas se agitam por causa das “profecias”
Maias, com sua visão cíclica e repetitiva do tempo, a Palavra de Deus nos dá
segurança e nos consola anunciando que o “tempo” não está à mercê dos fatos ou,
pior ainda, do acaso. O “tempo” não depende dos “ciclos”. O “tempo” é “graça”,
o “tempo” está nas mãos de Deus!
O
contexto bíblico, que não conhecia o relógio, é medido com a ampulheta. Na
ampulheta, quando a areia que está na parte superior desce para a parte
inferior, então o tempo “preenche”. Quer dizer, alcança a “plenitude” do tempo,
isto é, o tempo se torna “pleno”.
Nesta
ótica, em que tudo está nas mãos de Deus e não do acaso, também os sofrimentos
ou as coisas difíceis de compreender tem um sentido. Também o tempo do
“abandono” torna-se condição positiva e misteriosa “para que uma mãe dê a luz Àquele que deve vir”.
O
Natal nos ensina que o tempo é graça e que tudo está nas mãos de Deus. Cabe aos
cristãos, portanto, ter confiança porque Deus sabe para onde está conduzindo o
ser humano e a história e, certamente, não a está conduzindo rumo a outro
ciclo, mas está nos conduzindo para a plenitude!
Celebrar
o Natal de Cristo de forma pessoal, familiar e comunitária, é descobrir que a
Sua presença, fundamentada nas novas categorias de humildade, simplicidade e
confiança no Pai inauguradas por Ele, é capaz de levar paz e reconciliação aos
relacionamentos entre as pessoas.
Esta é
a fé da Igreja, expressa na liturgia: “Glória
a Deus no mais alto dos céus e paz na Terra aos homens de boa vontade”!
As
visões do tempo linear, típicas da bíblia, em contraste com a visão cíclica das
outras culturas do tempo, nos recordam que o caminho é sinônimo de
oportunidade, de projeto e de vocação: “De
mim está escrito no livro _ Eis que venho, Senhor, para fazer a Tua vontade”, diz
Jesus ao Pai, na segunda leitura (Hb 10,5-10).
A vida
humana não se insere numa visão repetitiva, na qual os tempos se alternam. Ela
é única e irrepetível, preciosa e particularmente única. Deus tem um projeto para
cada pessoa e escreveu esse projeto no Seu livro.
Essa
nova visão que o Tempo do Advento recorda a cada um de nós introduz também uma
nova categoria de sacrifício. Trata-se de tomar consciência de que a
obediência, a adesão à vontade do Pai, a resposta à vocação pessoal, vale muito
mais do que todos os sacrifícios exteriores. Com o seu “sim” ao Pai, Cristo
aboliu o primeiro sacrifício para constituir o novo, fundado no livre arbítrio
e na generosidade no relacionamento com Deus.
Graças
ao livre arbítrio de Jesus, que se faz homem por nós, “mediante a Sua livre
entrega fomos santificados”. Aqui também a Palavra de Deus nos convida a dar um
passo na direção do nosso coração, do nosso interior. O que interessa, de fato,
para Deus, se encontra não nas coisas exteriores, mas nas nossas decisões e
atitudes do coração.
O
Evangelho de hoje (Lc 1,39-45) nos apresenta o belíssimo “ícone” da visitação
de Nossa Senhora à sua prima Isabel: “Maria partiu para a região montanhosa, dirigindo-se,
apressadamente, a uma cidade da Judéia.” É a pressa da fé que quer responder sem rodeios: “Eis que venho, Senhor, para fazer a Tua
vontade”! É a pressa da esperança, que quer experimentar as promessas do
Altíssimo: “Também Isabel, tua parenta, na sua velhice concebeu um filho”! É a
pressa da caridade, que quer servir Isabel nas suas necessidades.
O
Evangelho nos diz que “Maria entrou na
casa de Zacarias e saudou Isabel”. Não sabemos, exatamente, que palavras
usou. Provavelmente se tratava de uma saudação hebraica por excelência:
“Shalom”! Uma saudação difícil de traduzir com uma só palavra. Dizer “Shalom!”
significa bendizer, isto é, dizer-bem. Desejar a uma pessoa todo o bem
possível. Os efeitos da saudação estão sob os nossos olhos. As duas mulheres se
“bendizem”, isto é, se abençoam uma à outra, “dizem bem de Deus, estão alegres
e em paz.
Os
frutos da bênção são relações humanas reconciliadas e harmoniosas. Aqui também
os caminhos de Deus são misteriosos. A paz se constrói, antes de tudo, com
atitudes do coração, antes de quaisquer gestos ou demonstrações exteriores.
Peçamos a Deus que o Natal do Seu Filho nos encontre prontos e atentos à Sua
voz, imitando aquela que, pela sua obediência, mereceu conceber o Verbo da vida
no seu ventre. (Frei Alfredo Francisco de Souza,
SIA – Superior dos Missionários Inacianos – formador@inacianos.org.br – Web
site: www.inacianos.org.br).
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