(Liturgia do Quinto Domingo da Quaresma)
Nestes três
últimos domingos da Quaresma a liturgia nos propôs o itinerário dos catecúmenos
rumo à Páscoa.
Hoje a liturgia
nos faz reviver um aspecto fundamental do Batismo, que é ser “sepultados” com
Cristo, para acolher, com Ele, o dom da vida nova.
Para fazer-nos
compreender este itinerário, somos levados à Betânia, povoado de Marta, de
Maria e do seu irmão, Lázaro.
Assim começa a
narração do Evangelho deste quinto domingo da Páscoa (Jo 11,3-7.17.20-27.33b-45): “Senhor,
aquele que amas está doente”. Mas
quem era Lázaro? Qual a importância de Betânia?
Lázaro era amigo de Jesus. E
como cada um de nós tem nas lembranças e no coração um lugar especial, rostos
concretos que marcam as suas experiências de amizade, assim também Jesus tinha
com relação a Pedro, Tiago, João... os discípulos, Marta, Maria e Lázaro, que
estavam entre aqueles que tinham laços estreitos e profundos de amizade com Ele.
A Escritura nos
recorda que “Quem encontrou um amigo
fiel, encontrou um tesouro” (Eclo
6,14), e estes tesouros, Jesus também nos advertiu sobre a necessidade de
possuí-los.
É maravilhoso
que o Evangelho deste domingo traga a pessoa de Jesus tão próximo de nós, nos
mostrando na sua humanidade.
A casa de
Betânia indica a importância dos relacionamentos de amizade na vida de cada ser
humano. É o lugar da tranqüilidade, do descanso na fraternidade, da intensidade
dos relacionamentos, da confidência e da alegria de encontrar-se, saboreando
não simplesmente a boa comida, e talvez o bom vinho, mas também saboreando, intensamente,
a beleza e a riqueza da amizade. Como é importante na nossa vida saber fazer da
amizade, das nossas relações, um “lugar de descanso”.
Procuremos,
então, compreender qual é a mensagem central que o Evangelho de hoje quer nos
comunicar, haja vista que no diálogo que acontece entre Jesus e os discípulos,
e depois entre Jesus, Marta e Maria, parece que, de fato, há dois planos de
compreensão na narrativa.
Um plano que “lê”
os fatos num nível de compreensão puramente humano, e outro que as “lê” com os
olhos de Deus. O olho humano só
consegue ver dor, angústia e tristeza nesta morte. Por outro lado, o olho de
Deus vê um “adormecer”.
São João Crisóstomo escreve:
”Deus tem amigos na terra e quando o homem tem Deus como amigo, a morte muda de
nome. Não é mais ‘morte’, mas é sono”.
Na verdade, tinham avisado que o Seu grande amigo estava doente. Jesus que se
encontrava em uma região distante, não se apressou para chegar logo a Betânia.
Havia dito aos discípulos que “Esta doença não leva à morte; ela
serve para a glória de Deus, para que o Filho de Deus seja glorificado por
ela”.
Aliás,
Ele já havia explicado que a escola do sofrimento tem um objetivo de redenção,
quando os discípulos perguntaram, no episódio da cura do cego de nascença, quem
havia pecado para que ele nascesse assim: “Nem
ele nem seus pais pecaram, mas isso serve para que as obras de Deus se manifestem
nele”.
Quando
Jesus chega a Betânia, não entra logo no povoado. As suas irmãs é que vão ao
Seu encontro para acolhê-lo e para exprimir-Lhe a sua dor.
Enquanto nós compreendemos as lágrimas de Marta e de Maria, e a
compaixão de Jesus para com elas, escutemos o que Ele diz a Marta. "Seu irmão ressuscitará
não só no último dia", mas naquele dia.
Depois de Jesus ter se apresentado como fonte de água viva à Samaritana
e como luz ao cego de nascença, agora se apresenta como a ressurreição e a vida,
e promete que quem crê n’Ele, mesmo passando pela morte, viverá.
Com a fé de Marta e Maria, uma fé ainda frágil, mas a caminho, sigamos
Jesus até o túmulo e escutemos quando ele agradece ao Pai porque O escuta.
Depois, escutemos o Seu grito dirigido ao amigo morto, ordenando-lhe para sair.
E eis que o amigo que estava morto retornou à vida, nasceu uma segunda
vez, ressuscitado!
Tanto o Evangelho de João como a Quaresma nos apresentam uma mudança,
uma “virada”. A ressurreição de Lázaro para João é o último sinal realizado por
Jesus. É este sinal que provoca a decisão da sua morte e antecipa o mistério da
Sua ressurreição.
No caminho catecumenal da Quaresma, depois das tentações, da
transfiguração, que manifestam a humanidade obediente de Jesus e a Sua divindade
escondida, depois da Samaritana e do cego de nascença, que nos apresentam os
símbolos batismais da água e da luz, eis agora o sinal de Lázaro, que nos
apresenta Jesus como ressurreição e vida, e nos introduz na semana santa.
Quem crê em Jesus como Messias, Senhor da vida, pode atravessar a morte
sem permanecer prisioneiro dela. Pode acompanhar Jesus na sua Paixão, confiando
como Ele confia no poder do Pai.
A fé na ressurreição, certamente, refere-se ao destino dos nossos entes
queridos após a morte física. Contudo, diz respeito também à vida de cada um de
nós agora, durante a nossa passagem neste mundo.
As duas primeiras leituras da liturgia hoje confirmam e explicam essa
realidade. Ezequiel (Ez 37,12-14)
anuncia a ressurreição do povo que estava no exílio, comparando esta situação à
própria morte e anunciando o retorno à terra prometida.
Paulo, escrevendo aos romanos (Rm
8,8-11) lembra-nos que aqueles que vivem segundo a carne já estão como
mortos. Já aqueles que vivem sob o poder do Espírito possuem uma fonte de vida
que produz os seus efeitos da vida já agora, levando-nos a realizar as obras da
luz, dando vida plena ao nosso corpo que é mortal, por causa do pecado.
Vencendo o
pecado, Jesus já venceu a morte e abriu para nós o caminho para a vida em
plenitude, que começa já neste mundo e depois, continua em Deus. Eis o
significado do Evangelho de hoje: a nossa vida, a vida que vivemos neste tempo
e neste espaço, já é a vida divina e, portanto, não nos será tirada, mas
simplesmente, “adormecerá”. É por isso que bastará uma voz, um grito para
despertá-la.
Que o Senhor nos
ajude a “afinar” sempre mais o nosso ouvido para escutar a Sua voz, de modo que
reconheçamos o grito, ou o sussurro, e nos acompanhe em nossa caminhada, para
que, em todas as situações em que experimentamos a morte, possamos experimentar
a força nova e eterna que vem do Seu amor e da Sua amizade para com cada um de
nós. Frei Alfredo Francisco de Souza, SIA –
Missionário Inaciano – formador@inacianos.org.br
– www.inacianos.org.br).
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