Este Décimo Nono Domingo do Tempo
Comum propõe o tema da Fé, justamente no Ano da Fé. Depois da parábola do rico
“louco” e do convite a enriquecer-nos aos olhos de Deus no domingo passado, a
liturgia de hoje nos fala da espera, lembrando-nos que o cristão é alguém
chamado a viver cada instante da sua vida no amor, esperando assim, o retorno
d’Aquele que nos amou até a morte.
Depois de ter tratado do tema da
fé diversas vezes, através das suas conexões com outras questões importantes a
Palavra de Deus nesta liturgia apresenta de modo mais direto, evidenciando o
centro do tema da fé através do capítulo 11 da Carta aos Hebreus (Hb 11, 1-2. 8-12): “A fé é um modo de já possuir o que ainda se
espera, a convicção acerca de realidades que não se vêem”.
A Carta destaca a fé de Abraão, o antepassado
de uma longa descendência de crentes que, pela fé “partiu, sem saber para onde ia. Foi pela fé que ele residiu como estrangeiro
na terra prometida, morando em tendas com Isaac e Jacó, os co-herdeiros da
mesma promessa”.
Portanto,
quem vive na
fé é peregrino, não só porque muda concretamente de moradia, armando a sua tenda aqui e acolá,
mas porque, caminhando rumo ao mistério de Deus, é estimulado a mudar, a não se
acomodar ou estacionar, bem como é chamado a viver fora dos esquemas, vencendo
a ideia de já ter chegado ou terminado sua caminhada.
Nesse sentido é interessante
pensar que o termo “paróquia”, que vem do grego significa “entre as casas”. No
sentido de que é uma referência entre as demais casas de certa localidade, a
paróquia, de fato, deve ser em primeiro lugar “a tenda dos crentes entre as
casas”, a habitação simples e provisória daqueles que caminham com fé e que
convidam outros a se tornarem companheiros da mesma viagem.
Ao mesmo tempo viver a vida na fé
é também caminhar na luz porque é “um
modo de já possuir o que ainda se espera”, de acordo com a segunda leitura.
Através dela, de fato, podemos nos tornar capazes de ver o que os outros não vêem
e, conseqüentemente, capazes de colocar a própria vida “em jogo”,
concretamente, por coisas que outros poderiam julgar como sendo uma loucura,
como a vida consagrada e sacerdotal, por exemplo.
A introdução do Evangelho é rica
em ternura. Jesus convida a não temer, chamando os seus amigos de “pequeno
rebanho”. Em seguida usa imagens que não indicam uma espera positiva.
Mas o administrador fiel e
prudente do Evangelho (Lc 12, 32-48)
sabe bem que o patrão cedo ou tarde vai voltar e, por isso, emprega todas as
suas energias para preparar o seu retorno. Esta não é, certamente, uma espera
tranqüila, mas cheia de preocupações.
Enquanto isso, a espera deve se
transformar num serviço de amor. Esta preparação, obviamente, não pode ser
baseada no medo de ser julgado, mas na confiança que, de acordo com a ordem do dono
da casa no momento da sua partida, é a coisa certa a fazer, porque é o melhor
para a vida do servo. Aliás, o verdadeiro servo não tem medo de dizer, crer e
de viver esta realidade: “venha a nós o vosso Reino, seja feita a vossa
vontade”!
Mas os servos, na ausência do dono
da casa podem também ter um pouco de tempo “livre” e podem, inclusive,
distrair-se, pois esperam que o patrão demore. Com razão, o dono da casa não
espera o ladrão, mas pelo contrário, espera que ele nunca venha.
Jesus não pretende aqui colocar
no centro do Seu ensinamento a pessoa a ser esperada, mas o modo como se deve
esperar. Trata-se da vigilância!
Se
os servos e os donos da casa são vigilantes a respeito de quem não desejam a
visita, no caso do ladrão, quanto mais nós devemos ser vigilantes a respeito de
quem, na alegria, queremos que venha nos visitar.
Ser vigilantes com relação ao
Senhor significa reconhecer que Ele sempre “vem” na nossa vida, e “bate à
porta”. Isso confere um sentido todo novo aos nossos dias.
Significa também admirar-se todos
os dias com Aquele que somos chamados a servir e que é Ele quem nos serve, como
no único e extraordinário gesto do lava pés. Aí está uma imagem clara da
Eucaristia, sinal cotidiano de um Deus que nos convida à Sua mesa e se aproxima
de cada um de nós para servir-nos, dando-Se a Si mesmo a nós!
Entre todos os funcionários
chamados a esperar, há o Ministério dos responsáveis pelas igrejas e pelos
pequenos rebanhos. Trata-se dos administradores, os pastores, os missionários e
missionárias, os consagrados e as consagradas. Eles, entre outros, não são
apenas chamados a esperar de modo vigilante, mas também são chamados a ajudar a
comunidade a eles confiada a viver nesta dimensão de amor e de serviço. É por
isso que somos chamados a rezar pelos nossos pastores e pelos missionários e
missionárias, para que estejam sempre prontos a reconhecer a “vinda” de Deus em
nossas vidas.
A fé a que se refere o texto da
carta aos Hebreus, convida-nos à fidelidade, confiança, e abertura para o
outro. O servo é "fiel" porque o Mestre é alguém que nos chama de
amigos, é alguém que se fez Servo.
Finalmente, é bom lembrar o que tanto
nos chamou a atenção o então Papa Bento XVI. Segundo ele é no encontro com Deus
que o homem é capaz de reencontrar a capacidade de discernir a verdadeira
liberdade. Portanto, é tendo Deus como referência, isto é, no centro de sua
vida, porque quem não consegue fazer isso, corre o risco de colocar o próprio
coração no centro, empregando aí as suas melhores energias, num “tesouro” que
não vale à pena!
Foi com a consciência de um
coração voltado para o maior de todos os tesouros que Abraão ofereceu o próprio
filho Isaac, para testemunhar que, nem mesmo o que mais se ama pode substituir
a Deus que é capaz de lançar o ser humano para além das suas limitações, num
horizonte de beleza, verdade, paz e plenitude.
Quem não fundamenta a sua vida em
Deus, quem não enraíza a sua vida na fé em Deus, não consegue nem mesmo receber
o Reino de Deus, porque recebê-lo significa partilhar com Ele o modo de
conceber a vida humana, de acordo com o projeto de uma humanidade à Sua imagem
e semelhança. (Frei Alfredo Francisco de
Souza, SIA – Missionário Inaciano – formador@inacianos.org.br
– www.inacianos.org.br).
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