(Liturgia da Solenidade da
Assunção de Nossa Senhora)
A
Solenidade da Assunção de Nossa Senhora, celebrada no Brasil neste domingo,
substituindo a liturgia do Vigésimo Domingo de Tempo comum, nos convida a
refletir e a concluir que, como Maria,
cada um de nós é peregrino neste mundo e não meros “passageiros” ou “turistas”!
Há, de fato, uma diferença
substancial entre ser peregrino e ser “turista”. Trata-se da meta e da esperança
que cada um tem em alcançá-la.
O “turista” e o peregrino podem até
percorrer a mesma estrada, encontrar as mesmas pessoas, enfrentar as mesmas
lutas, mas o peregrino sabe muito bem onde está indo, aonde quer chegar e o que
o faz caminhar! O turista, nem sempre! O peregrino enfrenta o caminho com a esperança de
quem sabe que precisa fazer todo o possível para chegar à sua meta!
A solenidade da Assunção
de Nossa Senhora nos lembra que somos peregrinos nesta vida, e não apenas
passageiros ou “turistas”. Recorda-nos também que a nossa história, conduzida
pelo amor de Deus, não é “escrita” em episódios sem sentido, que nos jogam de
um lado para o outro, mas que, pelo contrário, nos lança na direção de uma meta
e de um futuro!
A segunda leitura, da Primeira
Carta de São Paulo aos Coríntios (15,20-27ª)
afirma que “Cristo ressuscitou dos mortos
como primícias dos que morreram”. Isto é, Cristo é Aquele que, através da
Sua morte e ressurreição, reabriu as postas do céu para cada pessoa. A ressurreição de Cristo,
portanto, transforma a morte numa passagem que nos permite ser acolhidos nos
braços do Pai e gozar da mesma alegria e da mesma paz de Cristo, em plenitude.
Se a primazia da ressurreição é Cristo podemos, então, sem meios termos, dizer
que a Assunção de Nossa Senhora ao céu é o primeiro fruto de tal primazia.
A festa da Assunção nos lembra
que temos um destino e um futuro marcados pela plenitude de vida na comunhão
com o Pai e, ao mesmo tempo, constitui um mistério para a nossa fé. Mistério a
revelar que também nós, assim como ela, somos destinados a ressurgir um dia, de
corpo e alma; ou seja, com tudo o que somos e com toda a nossa história. Quando
isso acontecer, significará que as nossas relações de amor, vividas com o
coração e os gestos do nosso corpo, encontrarão a sua plenitude e a sua
realização enquanto meta, no amor de Deus.
Portanto, nada da nossa
história se perderá, nada terá sido vivido sem um sentido, nenhum daqueles
gestos de fidelidade, de amor, de humildade, de justiça realizados “de
corpo e alma” terão sido em vão.
Mas a festa da Assunção de
Nossa Senhora não nos fala apenas da meta e do futuro. Fala-nos também do caminho
que percorremos como peregrinos, no presente. Na verdade, isso deveria ser
suficiente para nos levar a uma profunda reflexão sobre a nossa própria vida e
sobre como a estamos vivendo, bem como sobre os caminhos que estamos trilhando
porque, o peregrino, isto é, o cristão, é chamado e estimulado a mudar, não
geográfica ou fisicamente, mas a não se acomodar ou estacionar, a viver fora
dos esquemas e a vencer a ideia de que já ‘chegou” ou terminou a sua caminhada.
Muitas
vezes, no entanto, a leitura que fazemos da nossa vida é um pouco pessimista. Quem
de nós já não pensou que gostaria de ter feito mais ou de ter feito ou agido
melhor? Quem de nós já não pensou que poderia ter feito escolhas mais corajosas,
mais éticas? Certamente, quando esses pensamentos nos vem à mente, ficamos um
pouco desiludidos, desencorajados e até mesmo desanimados!
Na
primeira leitura (11,19a; 12,1. 3-6a.10ab) do livro do
Apocalipse de São João “O
Dragão parou diante da Mulher, que estava para dar à luz, pronto para devorar o
seu Filho, logo que nascesse”.
Mais do que a imagem de Maria, nesta mulher podemos encontrar a imagem do povo
de Deus e, por que não, de toda a humanidade! Este quadro do Apocalipse nos
ensina que, diante do novo possível
que Deus nos mostra e quer fazer nascer na vida da Igreja, da humanidade e na
vida de cada um de nós, existe o mal que se opõe e tenta devorá-lo! Mas a leitura prossegue com um epílogo belíssimo: “A mulher fugiu para o deserto, onde Deus lhe tinha preparado um lugar”.
Como é maravilhoso pensar que o novo, o bem vence porque está nas
mãos de Deus! Percebamos que a mulher não retém o filho que nasce para si mesma,
mas o coloca nas mãos de Deus. É por isso que o deserto, o lugar para onde
fugiu vai se tornar um refúgio preparado pelo próprio Deus.
A
Assunção de Nossa Senhora já tem o
seu início na Anunciação, quando ela
acolhe o novo e a salvação que Deus quer realizar na sua
história, e que se exprime concretamente na viagem que ela realiza até a casa
de Isabel, como escutamos no Evangelho (Lc
1, 39-56) “Maria partiu para a região
montanhosa, dirigindo-se, apressadamente, a uma cidade da Judéia”. A
história de Maria torna-se, assim, uma assunção contínua! É um caminho seguro
guiado por Deus!
É
claro que o seu caminho é feito também de “deserto”, mas nada poderá “devorar”
a sua esperança, a sua alegria e os seus amores, porque tudo isso ela coloca
nas mãos de Deus, como se não lhe pertencesse mais. Desde o início da sua história o
que prevalece é o olhar de Deus. A sua vida está nas mãos d’Ele! É isso que
fará com que ela seja bem-aventurada, feliz e cheia de Graça, aos olhos de
Deus!
Nada na Assunção de Maria poderia
ser diferente, porque tudo nela sempre pertenceu a Deus e ao Seu projeto para a
sua vida: “Eis aqui a serva do Senhor!
Faça-se em mim segundo a tua Palavra!” (Lc 1, 25s). Aliás, o próprio
Jesus disse um dia aos Seus discípulos: “alegrai-vos,
porque os vossos nomes estão escritos nos céus”! (Lc 10,20).
Hoje esta celebração coloca ou
recoloca cada um de nós a caminho como peregrinos, de uma maneira toda nova.
Isso só poderá acontecer quando permitirmos a Deus “dispersar os soberbos e derrubar os poderosos de seus tronos”; quando
começarmos a parar de pensar que nós mesmos somos a fonte de nosso próprio bem
e do bem dos outros.
Quando isso acontecer compreenderemos
que a verdadeira graça que alguém deve esperar durante a sua existência, é a
certeza de viver bem, não porque é auto-suficiente, mas porque é guiado pelas
mãos de Deus. Então, será compreender, finalmente, a diferença entre uma vida
vivida segundo a própria vontade que quer, deseja e luta, muitas vezes, em vão,
e uma vida vivida na capacidade de aderir à vontade de um Deus misericordioso.
Peçamos, portanto, ao Senhor, que
a celebração da festa da Assunção possa, além de revelar a esperança do nosso
futuro e de toda a humanidade, nos dê coragem de permitir que Ele conduza, no
Seu amor, a nossa vida, exatamente como Maria fez! (Frei Alfredo Francisco de Souza, SIA – Missionário Inaciano – www.inacianos.org.br – formador@inacianos.org.br).
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