(Liturgia do Domingo da Solenidade de Pentecostes)
Por muitos séculos,
no Ocidente, o tempo é medido tendo o nascimento de Cristo como o ano zero. Na
verdade, a Encarnação de Jesus é um evento sem precedentes, que mudou para
sempre o curso da história. Um evento impensável se não tivesse sido anunciado nas
Sagradas Escrituras.
Jesus veio
revelar-nos a face de Seu Pai. Revelou a identidade de Deus, mas nos revelou
também a identidade do verdadeiro homem-mulher criado à imagem e semelhança de
Deus. Sua missão é salvar-nos dos
pecados e “resgatar” a criação e proclamar e estabelecer o Reino de Deus, que
tem por lei suprema o mandamento do amor.
Mas há outro evento,
de igual importância, que talvez não tenha recebido da humanidade a ênfase que mereceria
receber. Refiro-me à vinda do Espírito Santo no dia de Pentecostes. A Solenidade que estamos celebrando neste domingo, ao
encerrar, na liturgia, o tempo pascal.
Fico impressionado
sempre que me ponho a pensar na vida dos apóstolos! É outra coisa, após a
descida do Espírito Santo. Um vento forte entrou no recinto onde eles estavam e
apareceram, sobre suas cabeças, línguas de fogo. Foi assim que os discípulos
receberam o Espírito Santo, o amor de Deus derramado como um fogo! Foi então
que de homens fracos, os apóstolos se tornaram "muito fortes". De
homens medrosos, tornaram-se homens corajosos.
Eram homens ignorantes, e passaram a ser sábios. Não são mais agora
homens de disputas e rivalidades, mas homens da unidade. Eram homens frágeis, mas agora são homens capazes de tudo,
até mesmo de realizar, milagres e de enfrentar o martírio, em nome do Senhor.
É em Pentecostes,
com a vinda do Espírito Santo, que o projeto de Deus alcança a sua perfeição, a
sua linha de chegada! A consequência é que o fruto do Espírito somos nós, os
cristãos, que podemos, com a força do Espírito, nos tornar como Jesus. O que
aconteceu com os discípulos no dia de Pentecostes, deve acontecer conosco!
Assim aconteceu ao
longo dos séculos com todos os homens e mulheres que mostraram ser "Templo
do Espírito Santo" em seus próprios corpos. O Paráclito os inseriu na vida
divina e no amor que vai além da natureza humana e para além da morte. Graças
ao Pentecostes vivemos, portanto, este nosso tempo, que não teria sido o mesmo
se não tivesse vindo o Espírito Santo. Não haveria nenhum cristianismo. Não teríamos um amor filial à Maria. A África
não teria visto um Agostinho. Não teríamos conhecido um Inácio de Antioquia. A
Índia não teria nos dado uma Tereza de Calcutá, nem a Europa, um São Bento, ou uma
Santa Luzia. A América Latina não
conheceria Juan Diego e o nosso Brasil, não teria uma Irmã Dulce, Chico Mendes
e para ser mais atual, Irmã Dorothy Stang. No mundo inteiro não haveria tantos homens
e mulheres dessa categoria! Esses heróis e heroínas não existiriam e nós, continuaríamos
a ser escravos da lei, apenas talvez, com uma percepção ou intuição superficial
de Deus, com uma sede mais frustrante, à mercê de nossos instintos e humores.
É por isso que não
seria um absurdo, pelo menos para os homens e mulheres de fé e no sentido da fé,
dividir a história em antes e depois da vinda do Espírito Santo. Na
verdade, esta maneira de dividir o tempo seria, talvez, mais compreensível, haja
vista que a mudança definitiva do ser humano se deu com a descida do Paráclito.
Antes da vinda do Espírito, na verdade, o homem tinha, no máximo, apenas uma
intuição de Deus, e assim permanecia mesmo diante do Filho Jesus quando falava,
operava milagres e morria por amor às criaturas. Uma intuição companheira da
dúvida, mesmo entre os profetas, do “calibre” de Moisés ou João Batista.
A importância da
vinda do Espírito é tanta que, durante a última Ceia, faz com que Jesus afirme: "É bom para vós que eu vá. Se eu não
for, o Defensor não virá a vós. Mas, se eu for, eu O enviarei a vós”! (Jo
16,7). Fez também com que dissesse no diálogo com a Samaritana à beira do poço:
“Se conhecêsseis o dom de Deus e quem é
aquele que te diz: dá-me de beber, tu lhe pedirias, e ele te daria água viva”
(Jo 4,10ss).
O Espírito Santo,
que procede de Deus Pai e é enviado pelo Filho é, portanto, a água viva para a nossa necessidade de viver.
Porque todos nós temos sede de vida, sede de amor e de felicidade. Todos nós
temos sede de verdade, sede de Justiça e de paz. Todos temos sede! A
"sede" é nossa necessidade de criaturas, e manifesta nosso ser "finito". O Espírito Santo,
como água é o dom do Pai Criador às Suas criaturas, para satisfazer as nossas
necessidades sobrenaturais, isto é, "infinita",
para que satisfaça o nosso desejo e necessidade de ser cada vez mais imagem e
semelhança de Deus, em Cristo Jesus.
A Trindade não se
limita ao tempo através do qual somente podemos ver a intervenção do Pai, do
Filho e do Espírito Santo em três momentos diferentes. Na verdade, o amor de
Deus é realizado em um único momento e opera numa única substância. É através
do Espírito Santo que nós também podemos entrar nesse mistério Trinitário. É
pelo Espírito que seremos capazes de viver já e hoje a eternidade, transpassados
pelo amor de Deus e nos tornarmos uma nova humanidade, de acordo com o sonho de
Deus.
Não seria demais
afirmar que aqueles que se colocam sob a força animadora do Espírito Santo e
vivem sob a Sua unção, fazem qualquer coisa com um "espírito", no
mínimo, diferente. Para estes os sofrimentos do momento presente são
incomparáveis em relação à glória prometida e esperada! Conseguem amar até
mesmo os inimigos e viver na alegria. Com a efusão do Espírito Santo a Páscoa é
perfeita! Aquilo que, até então, existia em potência, se exprime
concretizando-se plenamente! A partir do Pentecostes o conceito ou a palavra
"impossível" não existe mais, nem mesmo no vocabulário humano. (Frei Alfredo Francisco
de Souza, SIA – Superior dos Missionários Inacianos – formador@inacianos.org.br – Website:
www.inacianos.org.br).
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