TRANSFIGURAÇÃO DO SENHOR
(Liturgia do Segundo Domingo da Quaresma)
Chegamos ao
Segundo Domingo da Quaresma.
Na liturgia de
hoje todas as três leituras tem como ideia principal o chamado que Deus faz ao
homem. Trata-se do convite a experimentar na própria vida quem Ele, realmente,
é.
A primeira leitura
(Gn 12,1-4a) narra o espetacular e incrível
chamado de Abraão. Estamos há cerca de dois mil anos antes de Cristo. Deus ainda
não era conhecido, a bíblia não existia, os profetas ou alguém semelhante,
capaz guiar um homem que quisesse descobrir quem era Deus, também não existia.
É neste contexto
que vem a ordem de Deus: “Abraão, “Sai da
tua terra, da tua família e da casa do teu pai, e vai para a terra que eu te
vou mostrar”.
Incrível! O texto
diz que era o Deus e que o chamado foi feito por Ele. Mas, como Abraão podia
saber que era o Senhor? Que aquela voz, de fato, vinha de Deus? O texto não diz
que Deus apareceu a Abraão, mas apenas que o senhor disse, falou a Abraão.
Podemos imaginar
qualquer coisa, mas o que é notável é o fato de que Abraão obedece a esta voz e
parte. Para onde? Ele não sabe nada naquele momento, mas confia, naquela voz
cegamente. O motivo? As promessas que a mesma voz lhe faz, promessas que
seduzem e desejo de qualquer homem: tornar-se grande, ser abençoado por Deus,
isto é, ter sorte. O texto termina assim: “E
Abrão partiu, como o Senhor lhe havia dito”... Isto é, põe-se a caminho
confiando naquela voz.
O Evangelho
também diz que Jesus toma consigo, isto é, chama, três discípulos que não apresentam
qualquer reação ao convite. Não perguntam nem por que, nem para onde Jesus os
está conduzindo.
Jesus os conduz
para o alto de uma montanha e ao longo do caminho, nem mesmo Pedro pergunta para
onde estão indo ou o que farão.
Neste domingo
temos, portanto, a narrativa da Transfiguração. Trata de uma experiência na qual
os três experimentam que Jesus é
Deus, portanto, eles encontram Deus, vêem Deus. Quanto a Abraão, sabemos que se
tornará o amigo de Deus, modelo de quem tem fé em Deus.
Ambos os chamados
são convites para fazer a experiência de Deus, para conhecer melhor a Deus: mas
isso é óbvio para nós. Para eles, no entanto, não.
O que nos faz
perder o fôlego é a maneira abrupta com que Deus chamou Abraão. Diz o livro de
Judite que Abraão teve que passar por muitas tribulações, podemos lembrar do
sacrifício do seu filho Isaac no seu caminho para o conhecimento de Deus.
O texto de hoje
mostra, justamente, o começo deste duro caminho. Sabemos que para os três discípulos
a experiência da Transfiguração não foi suficiente para a sua caminhada de
conhecimento de Cristo. Será necessária a duríssima prova da Paixão, que encontrará
o seu cumprimento na ressurreição.
Parece ser este
o método através do qual Deus se faz conhecer. Para cada um, ou mesmo com todos
o faz de maneira diferente, pessoal. Lembremos de Jó. Depois de todos os
sofrimentos, logo dirá: “Eu te conhecia ‘por
ouvir dizer’, mas só agora os meus olhos te viram”!
Começamos a
Quaresma e poderíamos pensar; “será como tem sido todos os outros anos... não
há nada de novo. Diante disso vale à pena lembrar que este pensamento,
infelizmente, expressa a ideia de que não há nada de novo com relação àquilo
que já somos.
Mas o grande
pedido da Quaresma não é, justamente, “crescer no conhecimento do mistério de
Jesus Cristo”? De fato, nós rezamos e manifestamos que queremos conhecer mais e
melhor a Jesus. Por outro lado, temos a dificuldade de enxergar as reais
necessidades deste tempo quaresmal, propício para o crescimento.
Em síntese, o
que ainda podemos aprender sobre Jesus? Vejo esta provocação nas leituras de
hoje, mesmo se não vemos a novidade que o Senhor quer nos trazer nesta
Quaresma, isto é, o conhecimento de Cristo, o nosso grande erro seria renunciar
a caminhar nesse processo.
Abraão parte
mesmo quando não sabe em que direção ir. Ele confia e pronto! Nós somos mais
afortunados do que ele, porque temos Jesus, como no Evangelho de hoje (Mt 17,1-9) que nos guia, que é nosso Mestre.
Entre outras
coisas, este é o resumo do Evangelho de hoje: o Pai nos dá, na verdade, a ordem
para escutá-Lo. Aliás, esta é única ordem que Deus nos dá no NT.
Escutá-Lo quer
dizer colocar-se no caminho para conhecer Deus, para fazer a experiência de
Deus na própria vida.
Talvez o desânimo
tome conta de nós pelo fato de não podermos prever o percurso deste
conhecimento de Deus. Mas é justamente nisso que está a beleza de, como diz o
Papa Francisco, “deixar-se surpreender por Deus”. Quando pensamos em desistir,
é então que Deus nos faz dar os maiores passos, para nos ensinar que é Ele quem
se revela a nós. Portanto, não é fruto dos nossos esforços.
Deus usa o
caminho do sofrimento para abater as nossas certezas, sinais do nosso orgulho. Somente
na humildade seremos capazes de confiar inteiramente em Deus. É isto que nos
pede o Senhor hoje, nesta quaresma.
Só quem
experimentou a beleza do encontro com Deus na própria vida, só esses
compreendem qualquer tipo de sofrimento diante da experiência do conhecimento e
da aproximação de Cristo.
Peçamos hoje a
Deus o dom da confiança total n’Ele. Peçamos o dom de abrir-nos ao Seu chamado,
de ter a coragem de dizer sim, mesmo quando não o compreendemos ou quando
nossos planos dão errados, para poder experimentar a doçura e a beleza da
descoberta de Deus em Jesus Cristo. Que Maria, Mãe e Mestra da confiança em
Deus nos ajude nesse caminho. (Frei
Alfredo Francisco de Souza – Missionário Inaciano – formador@inacianos.org.br – www.inacianos.org.br).
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