(Liturgia do Primeiro Domingo do Avento)
A Igreja é a
casa de Deus, onde vive uma grande família. É uma grande casa, porque somos
muitos, de todos os povos, tribos e línguas (Ap 7.9).
Como toda grande
casa, deve ser bem organizada para que tudo corra bem e de maneira
eficiente. Nesta casa o trabalho deve
ser realizado em conjunto, e com um único objetivo: manter a casa arrumada e
bem preparada para a chegada do Dono da casa. Este é o objetivo final, ao qual
estão sujeitas todas as pequenas metas intermediárias: preparar-se para a Sua
vinda, sem saber nada sobre o tempo e o momento em que virá. (At 1,7).
A única coisa
que sabemos, isto é, o que é certo é que todos nós sentimos um vazio que a vida
– inclusive a vida mais confortável e realizada - não pode satisfazer. Todos nós trazemos dentro de nós, a falta de
algo melhor, a falta, por que não dizer, de alguém?
Todos, mais ou
menos conscientemente, aguardamos a vinda de Jesus, o Senhor da Casa, que por Si
só é capaz de preencher aquela insatisfação que habita em nós.
Ciente dessa
realidade, a Igreja conduz a sua vida litúrgica numa dinâmica que nos ajuda a
viver, da melhor forma possível, essa experiência.
É nesse sentido
que hoje se inicia o novo ano litúrgico, o Advento. O Advento é o tempo de uma espera
alegre, de tomada de consciência da “já presença escondida” de Cristo no meio
de nós, mas também é tempo de vigiar, para não cairmos na escuridão do
esquecimento, ou da rejeição a Deus.
Neste primeiro
domingo do Advento, a Palavra de Deus nos recorda que o mundo precisa de uma força de esperança. Mas a pergunta é o que fazer
para obter essa força? Que caminho seguir? E do que se deve tomar consciência?
Como uma força de esperança
para o mundo de hoje, escreve o profeta Isaías na primeira leitura (Is 2,1-5): “Acorrerão todas as
nações, para lá irão numerosos povos e dirão: ‘Vamos subir ao monte do Senhor,
à casa do Deus de Jacó para que Ele nos mostre Seus caminhos e nos ensine a
cumprir seus preceitos”.
Aludindo à vinda futura do Messias, no fim dos tempos, o profeta nos diz
que virá um tempo no qual o Monte de Sião, sobre o qual surge Jerusalém se
tornará pólo de atração para todos os povos, sinal de pacificação geral, como o
próprio nome indica: Jerusalém, cidade da paz. Mas em que condições?
O profeta Isaías assinala duas condições: deixar-se guiar por Deus segundo
os Seus caminhos e saber como percorrer esses caminhos.
A Palavra de Deus nos propõe os Mandamentos e as bem aventuranças, como
as duas melhores estradas a seguir na vida, para percorrer estes caminhos.
São Paulo, escrevendo aos cristãos de Roma na segunda leitura (Rm 13,11-14), os exorta a praticar
alguns imperativos necessários a todos para um bom caminho de fé, e assim Paulo
resume: “Vós sabeis em que tempo estamos...
já é hora de despertar... despojemo-nos das ações das trevas e vistamos as
armas da luz”.
Se é urgente despertar, é porque caímos num sono profundo. A verdade é
que um dos perigos mais freqüentes da vida cristã, infelizmente, é o sono da consciência,
com relação à fé, o sono do coração no que se refere à vida ética e moral, e o
sono da missão, no que diz respeito à ação missionária do cristão.
A propósito deste último sono, a parábola da cizânia o ilustra bem.
Quando os servos percebem que junto à semente semeada no campo encontraram
também a cizânia, o que disse o seu patrão? “Enquanto dormíeis, um inimigo, de noite, semeou a erva daninha”!
Se, infelizmente, hoje no mundo, junto ao bem
há também tanto mal semeado, não seria também por causa do “sono” de nós,
cristãos? De fato, disse Jesus: “Os filhos das trevas são mais espertos nas
suas ações do que os filhos da luz” (Mt.
13, 27-28).
Diz ainda São Paulo na segunda leitura: “Despojemo-nos das ações das trevas e vistamos as armas da luz”. Ou
seja, é preciso libertar-se de toda e qualquer possibilidade de fazer mal a si
e aos outros, revestindo-se da armadura da luz.
Significa reforçar em nós o viver na transparência das nossas ações,
seja diante de Deus, seja diante do próximo, em todas as ocasiões.
Na verdade, isso corresponde a ter uma atitude e comportamento ético-moral
na vida pessoal, não imitando os contemporâneos de Noé, que o esnobavam com suas
zombarias, e não imaginavam estar indo ao encontro do “dilúvio” das suas más
ações, como alerta o próprio Jesus no Evangelho de hoje (Mt 24,37-44).
O apelo é para que nos revistamos de Cristo, vivendo não segundo as
exigências dos nossos próprios instintos, mas segundo as metas luminosas do
Espírito. Como, então, percorrer os
caminhos do Senhor?
Das duas leituras de hoje, resultam três
tomadas de consciência por parte de cada um de nós, para evitar andar longe dos
caminhos de Deus.
A primeira provém do alerta de Paulo aos
fieis de Roma. “A noite já vai adiantada, o dia vem chegando”! É um
alerta contra o perigo de uma sociedade que caminha tateando no
escuro.
A segunda tomada de consciência provém de um olhar para hoje. Infelizmente,
a situação se agravou ainda mais, pelo fato de que o permissivismo desesperado,
a indiferença religiosa, a “cristofobia”, a idolatria das novas ciências e
tecnologias, constituem um sério perigo para a nossa vida cristã. Contudo,
Paulo deixa entrever uma centelha de esperança, mesmo naquele cenário da
comunidade dos romanos, porque “o dia”,
isto é, a Luz de Cristo não pode ser sufocada por nada, nem por ninguém.
A terceira tomada de consciência nos faz despertar para o “atordoamento”
crônico e múltiplo ao qual todos somos diariamente submetidos pelo bombardeio acústico,
midiático e informático, que nos leva ao risco de não ter mais o tempo e gosto
necessários para silenciar e para refletir.
Que esta Eucaristia, neste início de Advento nos desperte, realmente,
para a vigilância como capacidade da mente e do espírito. É esta vigilância que
nos ajuda a manter sempre as malas prontas para o imprevisível, no porto da
eternidade. É o Senhor mesmo que nos diz no ensinamento do Evangelho de hoje: “Ficai atentos! Porque não sabeis em que dia
virá o Senhor.” (Frei Alfredo Francisco de Souza, SIA – Missionário Inaciano – www.inacianos.org.br –formador@inacianos.org.br).