(Liturgia da Solenidade da Assunção de Nossa Senhora - vegésimo domingo Ano B)
De vez em quando
me surpreendo a olhar para o céu estrelado durante as noites sem nuvens. Um
privilégio de quem mora nas cidades pequenas do interior do nosso Brasil, como
o interior de São Paulo.
Parece que é
quase possível tocar as estrelas luminosas que pululam, dando a impressão
de que estão bem próximas, ao nosso alcance, não obstante estejam distantes a milhões
de quilômetros.
As leituras da
festa da Assunção de Nossa Senhora nos convidam a levantar os olhos na direção
do céu. Elas não se referem propriamente à Maria Assunta ao Céu em corpo e
alma, como afirma o último dogma mariano. Tampouco o Evangelho faz referência a
esse artigo da fé católica. Mas a primeira leitura do livro do Apocalipse (11,19;
12,1.3-6.10) contém uma visão celeste e o objetivo final da humanidade,
destinada a participar da ressurreição de Cristo e da comunhão com Deus, como
lemos na segunda leitura (1Cor 15,20-27).
Na verdade o que
o Evangelho contém é, em primeiro lugar, uma "ascensão" de Maria, mas
não em direção ao céu e não no final da sua vida: “Naqueles dias, Maria se levantou e foi
às pressas às montanhas, a uma cidade de Judá”. A sua "ascensão", mesmo antes da sua Assunção é a subida
para a região montanhosa, para que lá no alto, faça o seu Sim virar serviço!
Isso acontece no
início, depois de ter recebido a visita do anjo Gabriel, e de Nazaré Maria se põe em
viagem rumo às montanhas da Judeia, para visitar a velha parenta Isabel, de
quem o anjo Gabriel havia falado.
Contemplando
esses três quadros que a liturgia “pinta” nesta festa, podemos compreender o seu
significado e colher os frutos para a nossa vida.
O quadro do
Apocalipse pinta uma luta. De um lado, uma mulher grávida, que dá a luz um
filho. Aqui podemos contemplar a humanidade que traz em si o anseio por vida.
De outro lado, um dragão que ameaça devorar o filho. Neste quadro podemos ver o
mal que atenta contra a vida!
O parto é bem
sucedido e o filho é levado diante de Deus, protegido contra os ataques do mal.
A luta entre o bem e o mal, que presenciamos todos os dias no mundo e experimentamos
na nossa própria vida, já é vitoriosa se olharmos para a visão celeste. O
Filho, Jesus, já está na glória de Deus, ainda que a humanidade, representada
pela mulher, ainda esteja a caminho nesta Terra, por um tempo transitório.
O quadro da
leitura da carta aos Coríntios nos faz contemplar o Cristo ressuscitado, que
venceu a morte não só para si mesmo, mas também para todos os membros do Seu
corpo, haja vista que a Sua ressurreição difunde os seus efeitos sobre todos
aqueles que creem n’Ele.
O presente,
tempo em que Paulo escreve aos Coríntios: “Como
em Adão todos morrem”, é também o tempo no qual Jesus submete a Si o inimigo, até
o momento de entregar o Seu Reino (“a realeza”) ao Pai, e a Sua Obra será, então,
completada.
Entre aqueles
que creem em Cristo e recebem os frutos da Sua ressurreição está a Sua mãe.
Maria Assunta ao Céu representa a humanidade que já participa da ressurreição
de Cristo. É nela, que representa todos nós, que Jesus cumpre a promessa feita
aos discípulos: “Quando tiver ido ao Pai,
voltarei e vos levarei comigo”.
A nossa
humanidade já se encontra, portanto, no Céu, não somente por que Jesus é o
homem, protótipo do ser humano, mas também por causa de Maria que, como mãe da humanidade, "levou-nos consigo".
O terceiro
quadro que as leituras da solenidade da Assunção de Nossa Senhora pintam é um
quadro mais terrestre e mais humilde. Nele a jovem de Nazaré vai visitar uma
parente idosa da Judeia. O pintor desse quadro (Lucas) não nos dá muitos
detalhes dessa visita, nem da viagem e tampouco da permanência de Maria naquela
casa. Toda a atenção é canalizada para o diálogo entre a idosa Isabel e a
jovenzinha Maria.
Isabel bendiz a Maria
saudando-a como a “mãe do meu Senhor”
e tece um dos mais belos elogios à Maria: “Bem-aventurada
é aquela que acreditou”.
Naturalmente era
de se esperar que Maria respondesse ao elogio mas, na realidade, ela abre a
boca para louvar o Senhor com o belíssimo cântico do Magnficat. É através do
cântico que Maria louva a Deus que realizou maravilhas na sua vida, bem como na
história do seu povo, para o qual se revelou como Aquele que faz justiça,
exalta os humildes e derruba os poderosos.
Maria reconhece
na sua história pessoal e na história do seu povo a ação transformadora de Deus.
É por isso que ela crê que isso não é apenas uma ilusão, mas o verdadeiro
caminho da história. Maria aponta para nós, portanto, o Deus que olha para a
realidade da humanidade: “porque olhou para sua pobre serva”. A sua fé é uma
fé encarnada na realidade. Aliás, foi essa fé que fez com que Maria
acolhesse o Filho de Deus; foi a fé que lhe permitiu acompanhá-lo até a cruz e,
finalmente, foi a fé que lhe abriu o caminho do Céu.
Um Céu que não é
uma realidade somente com o “fim” da nossa caminhada na Terra, mas que começa
já aqui para quem sabe “ler” nos eventos da vida e da história a presença
libertadora e salvífica de Deus. Este
vislumbrar o céu permitiu a Maria viver em plenitude a vocação na Terra, e a
humilde obediência à vida quotidiana na casa de Nazaré, a preparou para entrar
no Céu com o seu Filho.
Maria antecipa o
nosso destino de participação na ressurreição de Jesus, porque nos precedeu no
caminho de uma fé plena e total a Deus, que se transformou em obediência à Sua
vontade na Terra. (Frei Alfredo
Francisco de Souza, SIA – Superior dos Missionários Inacianos –
formador@inacianos.org.br – Website: www.inacianos.org.br).
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