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Pároco Frei Alfredo Francisco de Souza, SIA.


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sexta-feira, 6 de abril de 2012

PAIXÃO DE CRISTO: TREVAS X REALEZA E LUZ!


(Liturgia da Sexta-Feira da Paixão)
A Sexta-feira Santa é um dia todo especial. Somente hoje a liturgia nos propõe alguns gestos únicos, como no início da liturgia, quando o sacerdote se prostra em silêncio diante do altar; pelo fato de não ser celebrada a Santa Missa, mas uma liturgia especial e contém também o gesto dos fiéis em adoração à Santa Cruz, beijando o crucificado.
Este dia, juntamente com a Quarta-feira de Cinzas, é dia de jejum para os católicos. Pareceria, à primeira vista, um dia de luto. Às 15 horas se recorda a morte do Senhor Jesus na cruz. Ao final da liturgia vespertina do dia anterior, o Santíssimo Sacramento foi “levado embora” pelo sacerdote e a igreja ficou “vazia” e o altar, nu.
Tudo é silencioso até a noite do dia seguinte, o Sábado Santo, que em inglês é chamado de "Black Saturday", Sábado negro. O escuro exprime o sentido profundo da Sexta-feira Santa. Gostaria apenas de sublinhar que não se trata de um escuro de trevas de terror e pavor. É um escuro com “uma luz no fim do túnel”. Isto é, há uma luz de fundo, sóbria e que reflete sobre a Palavra de Deus nesta Sexta-feira Santa.
As leituras, que nos descrevem aquilo que humanamente poderia ser definido como uma completa falência, humilhante derrota e morte, nos conduzem a um horizonte inesperado de luz, vitória e alegria. A primeira leitura, depois de ter descrito o sofrimento e morte do Servo de JHWH (IAVÉ), é concluída com palavras verdadeiramente ricas de esperança e de sucesso: “Eis, o meu Servo será bem sucedido; sua ascensão será ao mais alto grau. (...) Eles espalhará sua fama entre os povos. Diante dele os reis se manterão em silencio, vendo algo que nunca lhes foi narrado e conhecendo coisas que jamais ouviram (...). Por isso, compartilharei com ele multidões e ele repartirá suas riquezas com os valentes seguidores”.
Descendência, vida longa, a alegria de cumprir a vontade do Senhor, luz e conhecimento, prêmio de recompensa e fim dos conflitos! O que mais se pode desejar? Tudo isso é o desejo de todo o homem, ou melhor, é isso que o homem definiria como “uma vida de sucesso”, ao contrário do fracasso.
O Salmo responsorial segue a mesma lógica. Depois de ter descrito de modo lírico e eficaz a experiência terrível da rejeição, do terror, da marginalização, da depressão e da morte, se abre à mesma visão de luz e de positividade da primeira Leitura, que chega ao final com grande força de confiança em Deus, resultando na experiência da libertação completa, da luz que resplandece no fim do túnel, da salvação no amor. A última estrofe dessa alegre experiência torna-se, finalmente, uma fraternal exortação para nós reunidos para celebrar a Paixão, morte e ressurreição do Senhor: "Fortalecei os corações, tende coragem, todos vós que ao Senhor vos confiais". O mesmo salmista que descreve os seus sofrimentos, torna-se instrumento de exortação à esperança e à coragem.
Na segunda leitura, da Carta aos Hebreus, que fala que "Ele mesmo foi provado em tudo como nós, com exceção do pecado", "forte clamor e lágrimas" de "morte" e também “por aquilo que sofreu”, ouçamos como palavras dirigidas a cada um de nós, cheias de conforto e consolo: “Aproximemo-nos, então, com toda a confiança, do trono da graça, para conseguirmos misericórdia e alcançarmos a graça de um auxílio no momento oportuno”.   A última palavra é, aqui também, confiança, graça, misericórdia e auxílio. Tudo isso é objeto do desejo do coração do homem. Quem tem estas coisas não é um derrotado, mas uma pessoa que possui as coisas fundamentais de uma vida digna da pessoa humana. Todas essas coisas são objetos da bênção bíblica: “Shalom”!
O Evangelho segue a mesma lógica. João, ao contrário dos sinóticos, não fala da agonia de Jesus no Getsêmani, do beijo de traição de Judas, da fuga dos discípulos, do processo diante do Sinédrio, dos ultrajes na casa do Sumo Sacerdote e da humilhação na casa de Herodes; tampouco menciona o escárnio dos espectadores diante da cruz. Não nos apresenta o grito de desespero de Jesus, a escuridão sobre a Terra no momento da morte do Senhor e nem mesmo o fim trágico de Judas.  Ao invés disso, apresenta diante de nós, e apenas João faz isso, diferente dos outros Evangelistas, uma série de flashes da luz no fim do túnel: o gesto de grande Majestade que Jesus faz diante daqueles que vieram prendê-Lo, o diálogo com Anás, sumo sacerdote, sobre a Sua doutrina, a cena tão significativa do “Eis o Homem”!, bem como a discussão sobre a inscrição a ser posta na cruz: Jesus de Nazaré Rei dos judeus.
O relato da Paixão no Evangelho de João, momento da máxima “derrota” de Jesus, apresenta alguns traços inconfundíveis de realeza e de luz. Aqui também se repete o mesmo dinamismo já visto nas outras leituras. Para João, Jesus crucificado é Jesus Glorificado. Ainda que o Domingo de Páscoa venha depois da Sexta-feira da Paixão e ainda que a Ressurreição venha, cronologicamente, depois da morte, parece que há uma dimensão de simultaneidade na liturgia de hoje. Isto é, a derrota sofrida pelo Senhor, já tem em si mesma um sentido de vitória. A Sexta-feira Santa já contém, em si mesma, a luz da Páscoa.
Peçamos ao Senhor que a luz da Páscoa ilumine a escuridão de todas as situações de sofrimento, solidão e tristeza. Que o Senhor Jesus ajude a todos os cristãos a acolherem a Sua Palavra com sincero coração, de modo que possamos viver de modo bom, correto e justo os momentos difíceis de escuridão, que invariavelmente se apresentam no percurso da vida humana. (Frei Alfredo Francisco de Souza, SIA – Superior dos Missionários Inacianos – formador@inacianos.org.br – Website: www.inacianos.org.br).

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