(Liturgia
do Décimo Sétimo Domingo do Tempo Comum)
Há alguns milagres que Jesus realiza
para saciar. Há alguns dos quais Jesus “foge” para longe como quem evita o
perigo. O motivo é que, ao invés da saciar, provocam ainda mais fome. Uma fome
que nunca pode ser saciada.
A cena evangélica deste décimo sétimo
domingo do Tempo Comum (Jo 6,1-15) nos
apresenta um dos primeiros milagres realizados diante dos olhos de uma grande
multidão. Contudo, no final, aponta para um outro tipo de milagre do qual Jesus
quer ficar longe a todo custo.
O primeiro é um milagre que sacia.
Trata-se da multiplicação dos pães e dos peixes. Um milagre que acontece a
partir daquilo que se tem, da realidade concreta daquelas pessoas, e só pode
acontecer quando se aceita partilhar. O
que Jesus faz, em primeiro lugar, na verdade, é ajudar a crer naquilo que se
tem, naquilo que se é.
Com certeza Filipe, que é posto à
prova por Jesus, sabe que no grupo há aquela pequena quantidade de alimento. O
pouco que se tem não é nada? Será que, mesmo sendo pouco, não significa nada, não
serve para nada? O que temos nunca será o bastante?
O primeiro movimento do gesto de
Jesus começa a operar um verdadeiro milagre sobre toda a falta de auto estima,
inferioridade e desvalorização. Portanto,
o grande milagre, mesmo antes da fartura, ajuda a reencontrar a confiança!
O segundo movimento do gesto de
Jesus ajuda a ir em direção à partilha. Aquilo que se tem, ainda que pouco ou,
aos olhos de muitos, sem importância, deve ser compartilhado. É isso que sacia!
Sacia quem age assim, quem encontra coragem para partilhar os próprios bens, os
dons, e sacia também quem se alimenta do que foi partilhado. Ou seja, os
famintos e sem coragem.
Jesus não distorce a natureza, tampouco
as leis da vida, como às vezes temos a tentação de desejar e pedir, com
expressões como: “por que Deus não acaba com a fome do mundo? Por que Deus não
faz um gesto e elimina as doenças, as guerras e a violência? Não! Deus não é um
mágico.
Na pessoa de Jesus, Deus age de modo
contrário a todo o tipo de artificialismo, ajudando-nos a entrar dinâmica das
leis da natureza e da vida.
Saciar a fome a partir do nada, isso
sim teria sido um milagre impressionante, fora de qualquer lei da natureza.Teria
sido um gesto mágico, como o próprio diabo já havia um dia proposto que Ele
fizesse, no início do Seu ministério: “Faça
com que estas pedras se transformem em pão, e todos acreditarão em ti”.
Mas Jesus está longe disso e vê esse tipo de atitude
como uma tentação da qual deve se distanciar. Mais discreto e mais eficaz, mais
de acordo com a lógica de Deus é o gesto de fazer uma pessoa tomar consciência daquilo
que tem e do que é, como também dos próprios dons, dos próprios recursos.
A dinâmica de Jesus está
fundamentada na lógica de Deus e é por isso que os seus movimentos são gestos
que podem ajudar a pessoa a agir confiando que o tem é importante, e a partir
daí, usando aquilo que tem, isto é, os seus recursos, os bens, a sua história e
a sua realidade toda,encontrar-se no amor, nas relações com os outros, na
partilha com os pobres.
Um outro milagre, ao qual se alude,
e que Jesus recusa absolutamente, é aquele no qual as pessoas parecem tropeçar,
quando querem fazer dele um rei. Ele se distancia dessa situação, porque
percebe que é justamente o oposto do que Ele acaba de fazer.
Se Jesus tivesse se prestado a essa
dinâmica, teria distanciado as pessoas de si mesmo e da responsabilidade de
encontrar no amor pelos outros a própria razão da vida. O pão não seria
multiplicado, nem os recursos de cada um, muito menos a vontade de partilhar,
mas apenas o poder de alguém, isto sim, teria sido multiplicado sem medida.
A multidão o procura para coroá-lo rei.
Está em busca de um homem forte para seguir, entusiasmando-se por um líder. Na
realidade, a multidão quer alguém que a desresponsabilize. Prefere tornar-se uma
massa indistinta em busca de um herói, atrás de um profeta e de um líder que
faz sonhar, mas que, na realidade, aliena e tira de cada um a responsabilidade
que tem de agir com os dons que Deus lhe deu.
Diante dessa perspectiva Jesus foge e
se esconde diante desse capricho! Não quer que as pessoas o encontrem. Não para
corresponder aos seus desejos de poder. Disse um não, em
alto e bom tom, a essa dinâmica. Eis
o que Jesus considera como verdadeiro milagre: cada um caminha com suas
próprias pernas, pensa com sua própria cabeça, torna, por assim dizer, o líder
e o profeta de si mesmo, o seu próprio chefe, e essa responsabilidade floresce
em vida sempre nova, justamente porque e quando cada pessoa sabe aceitar aquilo
que tem e aquilo que é. Quando sabe
fazer de si um dom para os outros.
Assim se constrói o sonho de Deus manifestado
na segunda leitura (Ef 4,1-6): “um só Corpo e um só espírito, como também é
uma só a esperança à qual fostes chamados. Um só Senhor, uma só fé, um só
batismo, um só Deus e Pai de todos que age por meio de todos e permanece em
todos”. Ou seja, só Deus é o nosso Rei! Nós somos, todos unidos num só
Corpo, irmãos e irmãs. O Reino de Deus é assim! Frei Alfredo Francisco de Souza, SIA - Missionário Inaciano. www.facebook.com/www.inacianos.org.br
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