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Pároco Frei Alfredo Francisco de Souza, SIA.


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sexta-feira, 6 de março de 2015

"DESTRUÍ ESTE TEMPLO E EM TRÊS DIAS EU O RECONSTRUIREI"

(Liturgia do Terceiro Domingo da Quaresma)

Neste Terceiro Domingo da Quaresma, os gestos e as palavras de Jesus ressoam forte, no episódio do  Templo de Jerusalém, quando derruba as mesas dos cambistas e grita "Tirai isso daqui! Não façais da casa de meu Pai uma casa de comércio!”
            Diante dos gestos e palavras de Jesus, precisamos superar a emoção imediata que sentimos quando vislumbramos este "quadro" do Evangelho e que, não tem a intenção de fazer com que prestemos atenção apenas na Sua "perda da calma".           
            Poderíamos, infelizmente, também, concluir que a atitude de Jesus diz respeito apenas aos que "negociam" os favores divinos, lidando com o sagrado como se fosse "negócio"; aos que escandalizam e reduzem a fé a mercado de compra e venda, a interesses escusos com Deus, como se não dissessem nada à cada um de nós.
            Dirige-se sim, aos vendilhões do Templo, mas relendo com mais atenção este trecho do Evangelho (Jo 2,13-25), é possível escutar sempre mais as palavras e os gestos proféticos de Jesus, confrontando-os com cada um de nós mesmos, relacionando-os com a nossa própria fé e nossa relação com Ele.
            Eis porque a liturgia e este tempo da quaresma impõe a cada um de nós a exigência que o Senhor, venha também "derrubar", de alguma forma, a nossa fé equivocada, redescobrindo e restabelecendo uma nova relação com Ele, através do Seu mistério Pascal.
            Confundir nossa relação com Deus, de fato, significaria não só transformar a nossa fé em mercado, onde reina a confusão e se estabelece um relacionamento falso e enganoso. Ademais, se "Deus é amor", confundir a relação com Ele significa também enganar-se sobre o amor, sobre a relação com os outros e até conosco mesmos!
            É por isso que Jesus, neste Evangelho, se propõe a "derrubar", juntamente com as mesas dos cambistas, a nossa "fé", em alguns aspectos. Na verdade, Ele "derruba" o nosso relacionamento equivocado com Deus com relação à noção de templo e da lei que, para o povo hebreu, são dois sinais da comunhão com Deus, por excelência.
            A verdade é que Jesus quer purificar esta comunhão onde a observância escrupulosa da lei e as práticas cultuais do templo, como a oferta de sacrifícios, ofuscaram o absoluto na Aliança entre Deus e o homem. Aliança que é iniciativa gratuita do amor de Deus que liberta e torna o homem capaz de fazer o bem.
            Na primeira leitura (Êx 20,1-3.7-8.12-17), isso aparece claramente: "Eu sou o Senhor, teu Deus, que te fez sair do Egito, da casa da escravidão". O absoluto da nossa fé, na verdade, é fazer experiência da misericórida de Deus, da Sua redenção totalmente gratuita e não merecida por nós, através do Seu mistério de mortte e ressurreição.
            É por isso que os discípulos conseguem compreender o gesto de Jesus no templo, mas conseguem  acreditar, de fato, somente depois da Sua ressurreição, porque fazem uma experiência pessoal de um amor totalmente gratuito de Cristo que os salva. Não porque eles se tornam "discípulos perfeitos e devotos", mas porque foram tocados em seus corações por esse amor crucificado e ressuscitado, que lhes abre à verdadeira Vida e lhes permite dizer:"Eu creio em Ti, Jesus", "Confio em Ti, Senhor!".
            Jesus sabe muito bem que, para recuperar o seu verdadeiro ser, o homem só conseguirá fazê-lo se deixar que Ele toque no mais profundo do seu coração: "Ele, de fato, conhecia o coração do homem"!       
            Cabe, portanto, a cada um de nós deixar-se tocar por Ele. A nossa fé nasce, realmente, de uma experiência de ordem afetiva - que não se trata de sentimentalismo - onde Deus toca o coração do homem, através do amor pascal de Cristo que lhe concede, novamente, o dom maravilhoso e gratuito de sentir-se "autorizado" a viver e a sentir-se justificado.
            "Não é o homem que compra a benevolência de Deus com sacrifícios  no templo, mas é Deus que conquista o coração do homem com o Seu sacrifício na cruz, manifestação evidente do Seu amor"!
            Infelizmente, Jesus vê no templo um distanciamento de Deus. Continua a ver na humanidade que também se distancia de Deus ou que constrói uma falsa imagem dele, que se torna cada vez mais forçada a realizar a própria vida sozinha, como também, com as próprias forças, pretende reapropriar-se da benevolência de Deus.
            Trata-se de pessoas que, desesperadamente, procuram ser fortes, ter sucesso, ser produtivas e, como nos sacrifícios do templo, chegam até mesmo, a oferecer a destruição do melhor que poderiam ter e ser, em nome de um reconhecimento da parte de Deus ou da parte dos outros!
            É essa ideia de Deus que O transforma num Deus tirano; que transforma a nossa fé em religião e em meros preceitos e o irmão em adversário, como também transforma a Palavra de Deus em dez preceitos que não libertam, mas escravizam. Diante dessa ideia equivocada de Deus, Jesus, como derrubou as mesas dos cambistas no templo, derruba o nosso coração, para libertá-lo e transformá-lo.
            O tempo da quaresma é tempo favorável para deixar que a força da Páscoa de Cristo entre em nossos corações e derrube aqueles "mercados" que ocupam e se apropriam do templo da nossa vida!
            Hoje somos convidados a deixar transparecer a Deus o que temos dentro de nós, de fato, à luz da Sua Palavra. Igualmente, à luz da Sua Palavra, peçamos a coragem da verdade para "derrubar" os nossos caminhos e métodos, "religiosamente corretos", atrás dos quais, muitas vezes, se esconde a negligência às  demandas mais básicas de justiça e honestidade em nossas vidas, todos os  dias.
            Deixemos que o Senhor derrube também e expulse os nossos "sinceros" momentos de oração e de participação na vida da comunidade, mas que imediatamente depois, permitem que difamemos os irmão, vivamos na mentira e sejamos desonestos com Deus e com os outros.
            O mesmo Jesus que no templo derrubou e expulsou, quer hoje derrubar também as prioridades de nossas vidas que, muitas vezes, escondem a nossa inércia e indiferença diante dos irmãos irmãs mais pobres, débeis e doentes. Que Ele derrube também nossa mentalidade mundana revestida de sentimentos evangélicos, transformando-nos em "mestres" acomodados de compromissos acomodantes, diante das inconveniências que, muitas vezes, o Evangelho nos apresenta. Vem, Senhor, e com a Tua misericórdia e o teu amor, toca e derruba os nossos corações.
(Frei Alfredo Francisco de Souza, SIA – Missionário Inaciano / https://www.facebook.com/inacianos).


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